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Leonardo Vale - Sindiasseio - RMBH

Diretor Jurídico da FENASCON



FGTS. Patrimônio do trabalhador?

26/12/2016

O FGTS foi criado por meio da Lei 5.107 de 1966 e começou a operar em janeiro de 1967. Foi criado como uma “opção”, “oferecida ao trabalhador”, em troca da estabilidade decenal a qual tinha direito. 

Antes de sua instituição o trabalhador que atingisse dez anos de prestação de serviços, ao mesmo empregador, adquiria estabilidade contra dispensa sem justa causa até sua aposentadoria. 

Quando o trabalhador opta pelo FGTS perde concomitantemente o direito a estabilidade, adquirindo o direito de receber, em caso de dispensa sem justa causa, o valor depositado mensalmente acrescido de multa fundiária no montante de quarenta por cento sobre o saldo depositado em sua conta vinculada. 

O FGTS é composto por depósito mensal, efetivado pelo patrão na conta vinculada do trabalhador, no valor de oito por cento da remuneração, acrescido de juros estimados em três por cento ao ano e atualização monetária, este sempre perto de zero. 

Em suma, trata-se de um patrimônio gigantesco que pertence aos trabalhadores, estes podem saca-lo sob as seguintes condições: no caso de demissão sem justa causa; culpa recíproca ou força maior declarada pelo Juiz; extinção da empresa; término do contrato por tempo determinado; aposentadoria; suspensão do trabalho avulso superior a noventa dias; falecimento; doença grave; decisão judicial; a partir da idade de setenta anos; catástrofe; compra de ações da Petrobrás; compra de cotas do Fundo de Investimento do FGTS, e do Programa de Aceleração do Crescimento; aquisição da casa própria sob requisitos específicos. 

O FGTS é gerido pela Caixa Econômica Federal sob as orientações do Conselho Curador, este um colegiado tripartite composto por entidades representativas dos trabalhadores, dos empregadores e representantes do Governo Federal. Por sua composição sempre que estiver em jogo o interesse dos trabalhadores estaremos em perigo, pois, se os outros dois lados se unirem os representantes dos trabalhadores serão vencidos e ratificarão decisões mesmo que em prejuízo dos interesses do total de trabalhadores brasileiros. 

Temos que ter muita cautela quando se tratar de questões relativas ao FGTS, este patrimônio é na verdade o dinheiro mais barato que há no mercado, sua remuneração de três por cento ao ano o faz muito atrativo aos interesses vorazes do capital financeiro e dos Governos de plantão. 

Há pouco tempo o Governo Federal lançou mão de quantia significativa, a fundo perdido, do nosso FGTS, em favor do programa Minha Casa Minha Vida. Isto significa que os valores destinados ao programa social não voltarão a compor o FGTS, foram simplesmente “doados”. Eu, você, nós trabalhadores não tivemos a oportunidade de nos manifestar em favor ou contra a dádiva do Governo Federal que por uma canetada unilateral, por meio do Conselho Curador, utilizou nosso dinheiro no seu interesse. 

Não temos que ser contra programas sociais, mas, não podemos admitir desfalques no nosso FGTS, sob pena dele se tornar deficitário como ocorre com o INSS. 

Agora o Governo por meio de Medida Provisória quer utilizar o nosso dinheiro do FGTS para lastrear empréstimos de bancos privados e estatais, não me parece justo por uma série de motivos. 

Primeiramente será utilizado um recurso remunerado pelo percentual de três por cento ao ano para garantir empréstimos que cobram juros de até catorze por cento ao mês. Não precisa ser economista para identificar que em pouquíssimo tempo o recurso remunerado por juros menores se esgotarão e restará uma dívida crescente. 

Por outro lado o FGTS, como já dito, foi trocado pela estabilidade no emprego, oferecendo ao patrão a perspectiva de demitir a qualquer tempo, sem justificativa, qualquer trabalhador. A hora de maior incerteza na vida de um trabalhador é justamente quando ele é demitido, e, se por necessidade, tenha usado seu FGTS para contrair empréstimo bancário, não se beneficiará do fim filosófico ou fetiche garantidor proposto em 1966 pela Lei que instituiu o FGTS. 

Na realidade a garantia serve apenas para blindar ainda mais o capital especulativo dos bancos que são os únicos beneficiados e os únicos que obtiveram lucros nestes tempos bicudos que vivemos, além de possibilitar que o capital do FGTS se transforme em capital privado dos bancos. Esta questão tentarei explicar melhor. O FGTS é remunerado a três por cento ao ano, suas forças vão garantir empréstimos, na melhor das hipóteses, de três por cento ao mês, juros sobre juros se a divida não for quitada seu valor avançará sobre os recursos do FGTS como um todo, transformando-o então em capital privado de quem emprestou.  

Seria justo e saldável ao trabalhador outras formas de utilização do seu patrimônio depositado no FGTS, gerido pela Caixa Econômica Federal sob as orientações do Conselho Curador onde temos assento, por falar nisso, quem são os representantes dos trabalhadores neste conselho? Qual a posição deles frente às ações que recaem sobre o patrimônio dos trabalhadores? Qual a forma que os alçou a tão importante órgão? Os nomes dos componentes do Conselho podem ser encontrados facilmente no “oráculo Dr. Google”, isto não basta. 

Dentre as opções de saque do FGTS não há uma relativa à saúde financeira do trabalhador, sendo socrático, se as condições de endividamento de um trabalhador o colocar em situação de penúria econômica, não seria esta condição de lançar mão de seus próprios meios para saldar suas dívidas? Não é melhor quitar divida galopantes hoje do que esperar a demissão para garantir seu pagamento? 

Ora se o FGTS tem condição econômica e jurídica para lastrear operações financeiras no mercado, tem também condição de oferecer aos seus proprietários condições de remuneração inferiores as oferecidas no mesmo mercado sem intermediários. 

A quem interessa a interposição de um terceiro na relação do FGTS e seus proprietários? Este terceiro seria capaz de abrir mão de seus lucros em prol da coletividade? 

Não estou falando de perfumaria tipo o banco tal apoia iniciativas sustentáveis...  ou a indústria tal cumpre seu papel social mantendo a Praça fulano... ou ainda a transnacional “K” é amiga da cultura. 

O FGTS pode e deve ser usado no desenvolvimento de nosso País, mas, antes tem que ser remunerado de forma há não perder pelo menos para a inflação, sua gestão não pode ser difusa e tripartite como é hoje. Seu verdadeiro proprietário tem que ser o protagonista e indicar as formas e meios a serem utilizados em sua administração. 

Qual o motivo que nos leva a aceitar que o Governo Federal seja o principal ator na utilização dos recursos dos trabalhadores? Somos tão débeis que não temos competência para gerir nossos recursos? Como nos é crível aceitar passivamente a participação de entidades patronais no Conselho Curador do FGTS? O dinheiro é nosso, eles, os patrões, depositam os oito por cento e pagam a multa fundiária para terem o poder de nos demitir a qualquer tempo e hora sem maiores explicações. 

Nosso País é gigante e nossos problemas ainda maiores, enquanto trabalhadores não entendemos ainda, a força que pulsa em nossas veias, se de um lado não detemos os meios de produção por outro, sem nossa força nada gira, quem movimenta a roda da produção somos nós, quem movimenta a economia doméstica é o fruto de nosso suor, ou seja,  nossa paga pelas horas despendidas no trabalho longe de nossas famílias. 

Em nossa história sempre fomos explorados, primeiro pelos colonizadores, depois pelos pós-colonizadores, depois pelos governos militares e civis. Essa sucessão de governos quebrou nosso país, quebraram nossa previdência social e pretendem quebrar nosso FGTS. 

Hoje os governos de plantão já lançaram mão dos depósitos judiciais como forma de fazer caixa, sem antes pagarem o que devem à sociedade protelando os improteláveis precatórios. 

Para começarmos a equalizar nossas mazelas temos que resolver o problema estrutural do no Estado Democrático de Direito. Nosso ente está doente, drena mais de cinquenta por cento de nossa riqueza produtiva por meio de impostos e não oferece praticamente nada em troca. O paquiderme estatal consome em suas vísceras nossa perspectiva de fundar um país justo. 

Faz-se inadiável a reforma administrativa do Estado, limitando seus gastos às questões básicas de custeio inteligente e nas áreas sensíveis afetas a saúde, educação e segurança. Temos que por fim aos privilégios de poucos em favor da valorização do mérito que valha para todos. 

Os brasileiros têm que levantar sua voz e fazer a diferença, quem financia o Estado em todas as suas matizes: União, Estados, Municípios, Poder Executivo, Poder legislativo, Poder judiciário, Empresas Estatais, Empresas Paraestatais, Empresas de Economia Mista, etc. somos nós brasileiros trabalhadores. Não somos convidados a nos fartar no banquete e somos intimados a pagar a conta. 

 

Leonardo Vitor Siqueira Cardoso Vale – Presidente do Sindi-Asseio RMBH.


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