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A redução da desigualdade passa pelas empresas

12/05/2021

Um bom modelo de remuneração de executivos pode contribuir para um sistema econômico mais inclusivo e equitativo

 

No mês em que se celebra o Dia do Trabalho, precisamos falar sobre desigualdade e como as empresas podem colaborar para reduzir o abismo social existente no Brasil. Durante a pandemia, essa diferença se tornou ainda mais evidente, mostrando que não estamos todos no mesmo barco. Uma parcela grande da sociedade está exposta a condições de enorme vulnerabilidade às tormentas de uma grande crise.

 

A pandemia expôs as consequências de um processo acelerado e acentuado de concentração de renda, patrimônio e riqueza. Vimos que os mais ricos ficaram ainda mais ricos, enquanto pobres têm, inclusive, maior incidência entre as vítimas da covid. Segundo a Forbes, a lista de bilionários brasileiros ganhou 20 nomes. Ao mesmo tempo, dados do Centro de Políticas Sociais da Fundação Getúlio Vargas (FGV), baseados em pesquisas do próprio IBGE, mostraram que 12,8% da nossa população ficou abaixo da linha de pobreza extrema. Em termos práticos, isso quer dizer que essa parcela precisa sobreviver com apenas R$ 246 por mês. Para se ter uma referência, de acordo com o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (DIEESE), a cesta básica aumentou 29% nos últimos 12 meses, chegando a R$ 1.014,63.

 

É fato que, com a industrialização, tivemos um progresso e desenvolvimento econômico. Em  1820, 95% da população vivia em situação de pobreza. Segundo o Banco Mundial, desde 1980, mais de 1 bilhão de pessoas saíram dessa situação. Muito disso se deve ao fortalecimento do crescimento industrial e uma economia mais global.

 

As empresas criaram e escalaram soluções de grande impacto em nossa sociedade. Porém, o mesmo capitalismo que abriu portas, contribuiu para graves distorções sociais e consequências ambientais negativas desse modelo, que precisa urgentemente ser redefinido.

 

No início dessa década, temos visto uma série de movimentos que buscam enfrentar concretamente as principais ameaças para um mundo mais justo e sustentável. Entre eles, o Capitalismo de Stakeholders, apresentado pelo Fórum Econômico Mundial em Davos em 2020, propõe uma nova lógica de pensar e fazer nas empresas, tirando os acionistas do centro do valor gerado e passando a integrar outros atores da cadeia de valor, como fornecedores, colaboradores e membros da comunidade.

 

As políticas públicas e filantropia são fundamentais para combater a desigualdade, porém insuficientes. A responsabilidade do setor privado é relevante nesse debate. De acordo com o Nobel da Economia, Joseph Stiglitz, as empresas devem cumprir três papéis: (i) pagar seus impostos, (ii) remunerar bem seus colaboradores; e (iii) investir em desenvolvimento.

 

Por meio de sofisticadas estratégias tributárias e fiscais, empresas e empresários se beneficiam de um sistema em que otimizam seus pagamentos. Aqui se abre um amplo debate de como rever fontes de originação de recursos para financiamento de políticas econômicas que reduzam a desigualdade como transferência de renda.

 

Contudo, é dentro das próprias empresas onde podemos concretamente endereçar a desigualdade de renda.

 

O especialista em governança corporativa, Renato Chaves, fez um levantamento sobre os salários do CEOs de empresas de capital aberto no Brasil em 2020 e viu que alguns executivos do alto escalão chegam a ganhar 600 vezes a mais do que a remuneração média paga aos funcionários das próprias companhias em que trabalham. Em um dos casos, um brasileiro médio precisa trabalhar cerca de 100 anos para ganhar um salário mensal de um desses executivos.

 

 

Esta é uma evidência da enorme distorção social que temos e como se perpetua a desigualdade. A lógica de "vamos crescer o bolo e, depois, distribuir" não é falsa.

 

No Sistema B, acreditamos em um sistema econômico inclusivo, equitativo e regenerativo para todas as pessoas e para o planeta. A comunidade global de Empresas B é uma das maneiras de mostrar que  um novo capitalismo é possível.

 

Para se buscar o certificado como Empresa B, parte dessas questões se referem à remuneração dos funcionários. Uma delas, em específico, questiona justamente qual o múltiplo salarial entre a maior e menor remuneração na empresa.

 

Precisamos assumir nossa responsabilidade, mostrar que é possível e agir de maneira concreta e objetiva. Hoje, mais de 90% das empresas B na América Latina têm um múltiplo salarial de até 20 vezes.

 

Diminuir diferenças, oferecendo uma remuneração justa e digna é só o começo para maior equilíbrio e um futuro possível. Temos um caminho longo a percorrer e com urgência.

 

No dia do trabalho, deixo aqui um questionamento: empresários e executivos, como vocês estão buscando um mundo melhor dentro dos seus próprios ambientes de trabalho?

 

* Marcel Fukayama é cofundador do Sistema B Brasil e Diretor Executivo do Sistema B Internacional

 

3 min de leitura

 

MARCEL FUKAYAMA*

12 MAI 2021 - 06H01 ATUALIZADO EM 12 MAI 2021 - 06H01

 (Foto: shutterstock)

https://epocanegocios.globo.com/colunas/noticia/2021/05/reducao-da-desigualdade-passa-pelas-empresas.html


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